Pesquisa confirma identidade de múmia egípcia
POR GREICE BECKENKAMPA cabeça de uma múmia egípcia que chegou ao Brasil na década de 1950 teve a confirmação de idade, sexo e origem em pesquisa realizada na PUCRS. Batizada pelos pesquisadores como Iret-Neferet (que significa olho bonito) viveu entre 768-476 a.C., segundo exame de radiocarbono (C14) realizado nos EUA. De acordo com o estudo, a cabeça é de uma mulher de 42 ou 43 anos, do final do Período Intermediário III (1070-712) e o início do Período Tardio (Saíta-Persa: 712-332 a.C.) do Egito. O material estava em um Museu de Cerro Largo, interior do RS. A pesquisa foi realizada pelo Grupo de Estudo Identidade Afro-Egípcias, da Escola de Humanidades.
O resultado do exame de radiocarbono atesta que o material tem entre 2.495 e 2.787 anos. É a primeira múmia do Brasil a ter idade confirmada cientificamente por este método. “Iret-Neferet se eleva como tributo às múmias perdidas do Museu Nacional e da história, como símbolo perene do povo egípcio, que tem nas múmias suas raízes mais profundas”, afirma o coordenador da pesquisa, professor Édison Hüttner.
A cabeça apresenta um olho artificial no lado esquerdo, identificado por meio de tomografia realizada no Instituto do Cérebro do RS. O olho é composto de uma rocha carbonática. Há também uma perfuração sobre o osso etmoide (na altura do nariz), realizada para a remoção do cérebro, procedimento da mumificação. Além disso, contém 22 faixas de linho, seda e fios de cabelo.
DNA
Iret-Neferet chegou ao Estado entre as décadas de 1950 e 1960, como presente de um egípcio a um morador de Cerro Largo. No final da década de 1970, foi doada ao Museu 25 de Julho, no mesmo município. Em 2017, Hüttner visitou o museu e deu início à pesquisa. A cabeça da múmia ganhou uma exposição, em julho, na Biblioteca Central Ir. José Otão, no Campus.
Hüttner destaca a continuidade das pesquisas, tanto para assessorar a preservação do material, como para buscar informações sobre a etnia e a origem da múmia. “Por meio da análise de DNA, que será realizada na Alemanha, vamos averiguar se não há parentesco com reis e rainhas egípcias”, completa.
Outra múmia existente no Brasil atualmente é Tothmea, que chegou dos EUA em 1995, e hoje está no Museu Egípcio Rosacruz de Curitiba (Paraná). No Museu Nacional do Rio de Janeiro, onde houve um incêndio em 2018, havia exemplares de múmias humanas.
Exame de radiocarbono |
Foi realizado em um dente extraído da múmia, depois que o dentista Éder Hüttner avaliou que estava em condições para o teste. Segundo a pesquisadora Rosalia Cunha, do Instituto do Petróleo e dos Recursos Naturais da PUCRS, a quantidade de Carbono-14 durante a vida do organismo é constante, assim como a do Carbono-12. Quando o organismo morre, a quantidade de Carbono-14 começa a diminuir em função da meia-vida, enquanto a quantidade de Carbono-12 permanece a mesma. “A partir da comparação entre a quantidade de Carbono-14 remanescente e da sua meia-vida é feito o cálculo da idade. No caso do carbono da múmia, a meia-vida é de 5.730 anos. Isto significa que, se um organismo morreu há 5.730 anos, ele terá metade do 14C do momento em que estava vivo”, completa. A datação radiométrica por carbono permite o enquadramento do artefato em um período mais específico do contexto histórico (ou pré-histórico, já que é possível datar objetos de até 60 mil anos), sendo muito útil para a corroboração de estudos arqueológicos. |
Como foi realizado o estudo
Para chegar ao resultado final foram realizadas entrevistas e diálogos, além de exames e análises como tomografia, avaliação bucomaxilofacial, tomografia computadorizada, datação por radiocarbono, espectrometria de raio X de energia dispersiva, isolamento de fungos filamentosos e leveduras, análise anatômica e antropométrica e descrição e análise arqueológica.
Participaram da pesquisa Éder Hüttner, Cinara Garrido, Francine dos Santos, Rosalia Cunha, Mariana Palmeiro, Fernanda Nunes, Cláudia Nunes, Anderson Maraschin, Letícia Marconatto e João Borges.
O estudo também teve a colaboração do coordenador do projeto Tothmea, no Museu Egípcio e Rosacruz, em Curitiba, e diretor do Museu de Arqueologia Ciro Flamarion Cardoso, em Ponta Grossa (PR), Moacir Elias Santos. Ele afirma que encontrar a cabeça de uma múmia egípcia é algo bem raro no Brasil. “Participar dos estudos com a Iret-Neferet nos proporciona um alento, tendo em vista a perda dos exemplares do Rio no incêndio. Hoje só temos duas múmias egípcias no Brasil, daí a raridade e a importância de ambas para a egiptologia nacional”, observa.
Características da múmia
Cabeça – 21 cm de altura, 19 cm de largura, 21 cm de comprimento. Peso: 1726.47 g
Olho – 2,5 cm de altura, 2,6 cm de largura, comprimento de 3,2 cm de largura. Peso: 7.34 g
Largura da parte branca do olho (esclerótica e íris) – 2,6 cm de altura, 1 cm de largura, 3 mm x 4mm de espessura.
Perfuração – entre 10 e 12 mm (sobre o osso etmoide na porção centro-esquerda. Essa foi realizada para a remoção do cérebro).
Fios de cabelo (diâmetro) – 0, 4 mm, 0, 5 mm, 0, 6 mm.
Medida da faixa de linho que envolve a cabeça – 12 cm de largura, 13 cm de comprimento (faixa mais comprida). Foram contadas 22 faixas que envolvem a cabeça.