Origem cultural e personalidade detectadas por vídeo
Pesquisa une ciência da computação e psicologia para analisar comportamentos de pessoas e grupos em meio a multidões
Uma tecnologia capaz de detectar, por meio de sequência de vídeos, traços da personalidade, emoções e até mesmo a origem cultural de um grupo de pessoas. O que parece roteiro de filme de ficção científica é resultado da ampla investigação interdisciplinar em parceria dos pesquisadores Soraia Raupp Musse, da Escola Politécnica, Angelo Brandelli, da Escola de Ciências da Saúde, e o doutorando em Ciência da Computação, Rodolfo Favaretto, responsável pelo desenvolvimento do software GeoMind.
A tese, realizada nos últimos quatro anos, utilizou dados geométricos, como a posição e o distanciamento entre uma pessoa e outra, para obter respostas a questões que, na psicologia, são alcançadas por meio de resposta a questionários ou observações. O projeto demonstra, entre suas propostas, que a personalidade de uma pessoa não diz respeito apenas a como ela se autoavalia, mas também em como ela se desloca no espaço em relação às outras. E isso tudo levando em conta a cultura de origem do indivíduo, seja ele brasileiro, alemão ou indiano.
PATROCÍNIO INTERNACIONAL
A nova tecnologia, com publicações em revistas científicas e congressos internacionais, ganhará um livro em 2019. Ela resulta de investimento privado internacional, proveniente da ONRG-Office of Naval Research Global. Em 2014, representantes deste escritório norte-americano em São Paulo vieram à PUCRS e perguntaram se a equipe de Soraia seria capaz de identificar grupos de ingleses e de brasileiros, por vídeo, em meio a uma multidão. “Havíamos simulado situações com pedestres saindo de estádios, mas não conhecíamos literatura sobre diferença cultural”, diz Soraia. Porém, o desafio foi aceito.
À época, Rodolfo foi selecionado para o doutorado. Com dificuldades em localizar informações no seu campo científico, ambos recorreram à Psicologia. O professor Angelo Brandelli, do Programa de Pós-Graduação em Psicologia, é especialista em psicologia social, na qual o estudo sobre multidões teve início no século 19. “É uma área que não estava em voga até surgir esse fenômeno de segurança e vigilância por câmeras”, destaca Brandelli.
Os três partiram em busca de evidências sobre diferenças no comportamento das pessoas em grupos e entre culturas. “Achamos questões interessantes como personalidade, que tem um componente que impacta como as pessoas se comportam em grupo, localizando diferenças entre países, e situações como velocidade de deslocamento e o distanciamento preferido entre um indivíduo e outro”, explica o psicólogo.
O trabalho do doutorando Rodolfo foi traduzir, matemática e computacionalmente, os comportamentos descritos na literatura em psicologia, aplicando-os em vídeos captados em espaços públicos, como estações de metrô. Ele buscou métricas para mapear nas imagens, por exemplo, a distância entre pessoas. Nesse sentido, um trabalho fundamental foi o da pesquisadora Agnieszka Sorokowska, de 2016, que constatou, por meio de entrevistas em 46 países, em todos os continentes, a distância média que um indivíduo manteria do outro se esse fosse um estranho. “Estabelecemos métricas para medir se a pessoa se manifesta social ou não – por meio do espaço que mantém dos outros”, diz Favaretto. Esses dados, migrados para a computação, foram essenciais para compor o software, que está a caminho do registro.
Modelo de personalidade |
A personalidade foi um dos pilares do trabalho. Para a pesquisa, adotou-se o modelo considerado o mais preciso na psicologia: OCEAN – sigla formada, em inglês, por cinco fatores dicotômicos:
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Aplicabilidade e futuro
A pesquisadora Soraia Musse prevê, entre outras possibilidades, a aplicação desse conhecimento em simulações de humanos virtuais mais realistas. Dois bolsistas de iniciação científica do grupo liderado por ela estão utilizando o software criado por Favaretto.
Eles pesquisam diversas filmagens, como situações anteriores a ataques terroristas, para testar se é possível detectar emoções, cultura e personalidade dos sujeitos exibidos nas imagens. Após todo embasamento teórico que deu suporte à nova tecnologia, a próxima etapa da pesquisa será a filmagem de pessoas com avaliação prévia de suas personalidades, para melhor comparação dos modelos com dados da vida real.