Saúde

Zika: o vírus que assustou o País

InsCer divulga dados preliminares da pesquisa sobre crianças com microcefalia contaminadas pelo vírus

Por Flávia Polo

Mães e filhos vieram de Maceió para os exames com a equipe do InsCer

FOTOS: FLÁVIA POLO

Quando o Brasil enfrentou um surto de microcefalia oriunda do Zika vírus, em 2015, pesquisadores se uniram para tentar elucidar as causas e as consequências dessa doença para os recém-nascidos. O Instituto do Cérebro do RS (InsCer) contribuiu com os estudos e criou uma equipe de pesquisadores encabeçada pelo diretor Jaderson Costa da Costa, em parceria com o Hospital Universitário Alberto Antunes e com a Diagnóstico por Imagem (Dirad), ambos de Maceió.

De 2016 a 2019, 30 crianças, de dois a quatro anos, viajaram 3.513 km de avião de Maceió a Porto Alegre para realizarem diferentes testes tanto da parte estrutural quanto funcional do cérebro. Outros 17 pequenos passaram pelos mesmos testes em Alagoas.

Observou-se que as crianças com microcefalia pelo Zika vírus apresentaram comprometimento severo na aquisição e no desenvolvimento das habilidades cognitivas, linguísticas e motoras. O momento da gestação em que ocorreu a infecção pelo Zika se mostrou importante na gravidade dos casos e ao impacto no desenvolvimento.

“No que se refere à linguagem, evidenciou-se que os pacientes cuja infecção materna ocorreu no primeiro trimestre gestacional apresentaram prejuízo bem maior nos domínios de linguagem receptiva e expressiva do que o grupo em que a mãe foi infectada no segundo trimestre da gravidez”, afirma a neuropsicóloga Danielle Irigoyen da Costa, uma das responsáveis pela aplicação das avaliações de desenvolvimento psicomotor, denominada de Escala Bayley.

EXAMES DE PONTA

As crianças também passaram por um exame de neuroimagem para avaliar a estrutura e as conexões do cérebro. “Esses achados serão correlacionados com os dados clínicos, neuropsicológicos e neurofuncionais de cada paciente”, afirma o neurorradiologista do InsCer, Ricardo Soder.

Também foi avaliada a organização da atividade elétrica cerebral durante o sono, em associação a outros parâmetros clínicos. “Nosso objetivo foi auxiliar a identificar o tipo de convulsão que esses pacientes apresentaram e graduar a gravidade do quadro de epilepsia, buscando o melhor tratamento”, explica Magda Lahorgue Nunes. A neuropediatra observa que, em vários casos, as mães não percebiam que seus filhos tinham crises epilépticas, o que era confirmado apenas no InsCer, através deste exame.

Por fim, as crianças foram avaliadas quanto à funcionalidade do córtex cerebral com uma técnica não invasiva adaptada a esse estudo. Trata-se da Espectroscopia funcional de infravermelho próximo (fNIRS), que permite avaliar o consumo de oxigênio pelas áreas envolvidas em determinada atividade cerebral. “Os resultados preliminares mostraram um aumento do consumo de oxigênio na área cortical correspondente à audição”, afirma a engenheira de computação e doutoranda na Escola de Medicina, Nathalia Esper.

Aline e João Miguel: história de amor e superação

Força-tarefa a favor da vida

“O pessoal do InsCer foi maravilhoso, eu só tenho a agradecer. Fizeram exames bem específicos no meu filho que ajudaram a entender melhor o que ele tem”, afirma Aline Lourenço, mãe do João Miguel, de três anos, diagnosticado com microcefalia por Zika vírus. Aline foi infectada pelo Zika quando estava grávida de três meses, ainda sem saber de sua gestação.

Na época, ela não se preocupou. “Eu só descobri que ele realmente tinha microcefalia quando nasceu”, lembra. No início, Aline rejeitou a criança. “Mas, depois, percebi que eu era a única pessoa que ele tinha para cuidar dele”. De lá para cá, sua vida gira em torno de Miguel, que não anda, não fala, nem se alimenta sozinho.

Para ajudar mães como a Aline que os pesquisadores do InsCer se uniram e fizeram uma força tarefa ao longo desses últimos anos a fim de entender as consequências dessa enfermidade e buscar o melhor tratamento possível”, afirma o neurologista Jaderson Costa da Costa, diretor do InsCer.

Costa fez o caminho inverso ao das mães em agosto deste ano, quando viajou a Maceió após a finalização do projeto Zika Vírus, com a vice-diretora do InsCer, Magda Lahorgue Nunes, e a pesquisadora Graciane Radaelli, para apresentar os resultados preliminares do estudo aos médicos de Alagoas e às mães das crianças com microcefalia.

A partir de agora, os dados serão analisados e estarão disponíveis em benefício de políticas públicas de tratamento e prevenção da microcefalia por Zika vírus no País.