Ciências contribuem para compreender a transmissão do vírus e antecipar decisões importantes
Nos últimos meses, os noticiários têm sido invadidos por gráficos relacionados à pandemia da Covid-19. Um, em especial, tornou-se extremamente conhecido: o que mostra a curva de transmissão, que se fala tanto em “achatar”. E, para a elaboração e compreensão desses gráficos, além dos profissionais da saúde envolvidos, é necessária também a atuação de profissionais de uma área que não lida diretamente com pessoas, mas com números: a matemática.
Conforme o professor da Escola Politécnica da PUCRS Filipe Zabala, a relação entre saúde e matemática não é algo novo. Segundo o artigo The first epidemic model, a primeira contribuição da área para a epidemiologia é atribuída ao médico e matemático Daniel Bernoulli. Em de abril de 1760, Bernoulli fez uma palestra na Academia Real de Ciências de Paris, na qual demonstrou as vantagens da inoculação contra a varíola – prática muito debatida na época.
Desde então, outros estudos foram surgindo, mostrando informações relevantes para a área da saúde, como identificar qual o risco de contaminação por uma doença a partir do número de casos registrados na população. Em relação a epidemias, percebeu-se que a transmissão avança constantemente em diminuição da velocidade, até atingir seu ponto mais alto – o chamado “pico” da curva. Quando isso acontece, ela começa a cair.
Atualmente, existe uma área da matemática, chamada biomatemática, que estuda, entre outras questões, o crescimento de populações de seres vivos perante o convívio com outros seres vivos. Ao mesmo tempo, a estatística vem trabalhando constantemente junto à área da saúde, colaborando, por exemplo, em estudos de efeitos de tratamentos em populações de controle e em problemas de epidemiologia. “Quando se trada de uma pandemia, as duas ciências também contribuem muito no que diz respeito à economia – que, em período de quarentena mundial, está intimamente ligada à saúde”, destaca o coordenador dos cursos de Matemática da Escola Politécnica, professor Augusto Vieira Cardona.
Mas, afinal, como matemática e estatística ajudam a enfrentar a Covid-19? Conforme conteúdo produzido pelo Museu de Ciências e Tecnologia da PUCRS (MCT), disponível aqui, modelos matemáticos têm sido muito utilizados para determinar a disseminação do vírus, bem como os números de infectados, de mortes e de hospitalizações. Todos esses modelos, conforme explica Zabala, são simplificações e idealizações da realidade: “A ideia de que complexos sistemas físicos, biológicos ou sociais possam ser precisamente descritos por um modelo é pouco verossímil”. Ainda assim, essas representações são fundamentais para análises científicas e de mercado, pois podem direcionar decisões em situações de incerteza.
“Os modelos são baseados nos dados disponíveis e no conhecimento técnico do profissional de modelagem. O confronto entre os valores preditos e realizados é a forma mais eficiente para comparar a capacidade preditiva dos modelos e fornecer ideias para a calibragem dos mesmos”, aponta Cardona. Assim, matemática e estatística ajudam a simular o comportamento futuro da pandemia, levando em consideração os dados colhidos e possíveis ações de controle do crescimento da enfermidade.
Segundo Zabala, o modelo Susceptible-Infected-Recovered (SIR) é um dos mais simples que se tem para explicar a propagação de um vírus em uma população. E, quanto mais preciso for o modelo, melhores são as decisões que podem ser antecipadas. “Como a situação que estamos vivendo é totalmente nova, não temos informações que nos apresentem uma ideia do que vai acontecer. Dessa forma, qualquer modelo que nos dê uma noção de como a disseminação do vírus acontece entre a população mundial é importante para garantir que não haja uma sobrecarga no sistema de saúde e que o governo possa retomar a economia com segurança”, aponta.
Outra área que pode auxiliar em contextos de pandemia, principalmente no que diz respeito à orientação de governantes, é a análise de riscos. Através dela, é possível ter uma ideia de possíveis cenários mediante ações de controle do crescimento do contágio. Isso é importante para estabelecer de que forma o movimento da população poderá ser liberado, sem perder o controle da situação – o que levaria a uma incapacidade de atendimento aos infectados.
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Muitas pessoas torcem o nariz para a matemática por considerarem algo difícil e, talvez por isso, não se interessam pelo assunto. Conforme Cardona, é o “patinho feio das ciências”. Por isso, entender o quanto ela é relevante para a sociedade pode mostrar outro lado dos números. Para o professor, este pode ser um momento de mostrar a importância da matemática e da estatística para a simulação de um mundo melhor. “Os modelos propostos podem indicar o caminho mais eficiente para a humanidade alcançar a sustentabilidade e o melhor convívio com a natureza”, conclui.
Há uma subárea da matemática e da estatística aplicadas que se dedica ao estudo e à análise da distribuição, de padrões e de determinantes das condições de saúde e doença. Trata-se da Epidemiologia, uma modelagem multidisciplinar, que também pode envolver profissionais de áreas como Biologia, Economia e Física. Um bom exemplo de que como trabalhar com números tem impactos práticos na sociedade.
A PUCRS oferece dois cursos de graduação em Matemática: Licenciatura e Bacharelado (Empresarial), permitindo que o aluno vivencie experiências pedagógicas ou empresariais.
Os estudantes podem participar de projetos de pesquisa de mercado, políticas ou mesmo voltadas para a saúde, dentro da área da estatística. Há ainda a possibilidade de se dedicar mais especificamente a pesquisas sobre o ensino da disciplina. Na Matemática Aplicada, por exemplo, os estudantes têm contato com as áreas de estudos dos professores do curso.
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