Que tal reservar alguns minutos para uma prática de silêncio, contemplação, leitura do Evangelho e oração?
Foto: Bruno Todeschini
No dia 17 de março, iniciamos a quarentena em nossa comunidade universitária, seguindo as orientações dos órgãos de saúde que recomendavam o isolamento social. A pandemia chegou em meio à Quaresma. A propósito, você já notou que quarentena e Quaresma possuem a mesma raiz? Ambas possuem o princípio do tempo necessário.
A Quaresma é tempo de jejum, caridade e oração. Neste período, somos convidados a buscar momentos de recolhimento, valorização e busca do silêncio e intensificação das orações, a fim de que a revisão de nossa vida possa acontecer. Muitos de nós estão realizando suas atividades em casa, aprendendo a gerenciar o tempo e as suas prioridades nesse contexto de pandemia. Que tal reservar alguns minutos para uma prática de silêncio, contemplação, leitura do Evangelho e oração?
Para se preparar, fique atento a estas duas dicas essenciais para organizar o tempo e o espaço em que vamos cultivar a prática desta oração individual:
1. Prepare um local acolhedor para uma oração meditativa: Todas as casas possuem cômodos para comer, dormir e relaxar. Neste período de quarentena, para iniciar o seu momento de oração, é importante também criar um lugar especial para Deus dentro de sua casa. Este local de oração pode tornar-se acolhedor com poucas coisas: uma cruz, uma Bíblia aberta, algumas velas, ícones e objetos que tenham uma real ligação com sua fé.
2. Mantenha uma claridade discreta, não ofuscante: Você pode usar velas ou lamparinas. É possível também deixar um espaço vazio, usar panos ou um tapete no chão, para se sentar ou se ajoelhar. O importante é que seja um lugar que se torne sagrado para você, um espaço que te convide à oração e ao silêncio. Não precisa ser um quarto, basta um local longe de distrações e de aparelhos eletrônicos, onde você possa acalmar seu coração e sua mente, além de cuidar de sua alma, seja rezando, seja meditando silenciosamente, pelo tempo que você se sentir confortável e necessário.
Antes de começar, entenda um pouco do contexto e desta metodologia:
Meditação Maranatha A meditação Maranatha está fundamentada em três degraus e, como uma escada, quer nos conduzir em direção ascendente. Cada passo possui um sentido e um propósito. Os termos usados para nomear cada passo têm origem nas línguas aramaica e hebraica, que fizeram parte da realidade de Jesus. Tais palavras estão cheias de mística na tradição cristã. O primeiro passo é o Ruah, o segundo, Maranatha, e o último é Shekinah. O nome dado a cada passo busca orientar quanto ao sentido para aquele que medita, convidando-o a fazer uma profunda experiência com o sagrado. A própria nomenclatura de cada um dos passos descreve a ação a ser realizada.
Foto: Eli DeFaria/Unsplash
Ruah é uma palavra hebraica, que pode ser traduzida por vento, sopro, hálito, espírito. É o princípio que distingue os vivos dos mortos, sendo em algum momento compreendida como sopro da vida. Na Teologia, a tradução mais comum é ‘espírito’. No entanto, para nossa dinâmica, este primeiro passo significa o sopro de vida. Neste primeiro degrau, direcionamos nossa atenção para nossa respiração. O exercício nos conduz a determos nossa atenção e sentidos em nossa respiração, no ar que inspiramos e expiramos.
Foto: Jeremy Yap/Unsplash
Maranatha é o passo central de nossa prática. Ele é o segundo, está no meio, é o mais longo e exigente. Maranatha é um termo aramaico. Alguns teólogos o consideram como um imperativo: “Senhor nosso, vem!” São João Paulo II, em sua carta para o jubileu do ano 2000, citou o termo: “A Ele, meta da história e único Salvador do mundo, a Igreja e o Espírito gritaram: “Maranatha — Vem, Senhor Jesus!” Neste passo, buscamos o silêncio e tentamos nos aproximar do nosso íntimo. Fazemos desta palavra, “Maranatha”, uma oração. Recitamos em quatro sílabas de igual duração. Ouvimos enquanto vamos repetindo com suavidade, mas continuamente. Buscamos não pensar ou imaginar nada. Não é fácil. Vemos que inúmeros pensamentos podem surgir, e está tudo bem. Cada vez que isso acontecer, voltemos com docilidade para a entoação da palavra.
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Shekinah é nosso último passo. É um termo hebraico e um dos seus significados pode ser entendido como ‘habitação’. Geralmente, é aplicado para falar da manifestação da presença de Deus que habita entre seu povo. Outros estudiosos dizem que pode ser entendido como “a glória de Deus manifestada”. A Shekinah (“Ele fez habitar”) aparece na literatura rabínica, fazendo alusão à presença divina em Israel. Alguns exegetas judeus usaram a palavra Shekinah ao falar da presença divina como que “abraçando” o povo escolhido. Percorremos um caminho de silêncio e profunda súplica a Deus. Agora, rogamos diante dele. Nosso corpo, se transforma em templo do Espírito Santo. Somos habitados por Deus, e prostrados buscamos com humildade estar diante de sua presença. Este passo caracteriza-se pela intimidade com Deus. O que fazemos diante de Deus? Podemos suplicar-lhe, pedir repostas, chorar, agradecer? Não existe uma regra. Há apenas um caminho: escutar o coração. Existem dias em que apenas agradecemos, outros em que somos envoltos em súplicas de ajuda, e outros, ainda, em que apenas ficamos em silêncio, sentindo o abraço misericordioso de Deus.
Acompanhe o passo a passo para realizar na sua casa esta meditação cristã:
Passo 1: Ruah “O espírito sopra onde quer, e ouves sua voz; mas não sabes de onde vem nem para onde vai, assim é todo aquele que foi gerado do Espírito.” (João 3, 8-9)
1. Encontre um local tranquilo e silencioso. Sente-se confortavelmente, feche os olhos e busque relaxar. Tente liberar a tensão de seu corpo. 2. Ouça todos os sons que possam ser percebidos neste momento. Busque escutar os sons mais distantes e os mais próximos. 3. Comece apenas a observar sua respiração – como está seu ritmo, sua intensidade e seu volume. 4. Depois de um tempo, passe a respirar com suavidade, leveza e lentidão. 5. Lembre-se que este é nosso primeiro passo, o Ruah, o sopro de vida! Concentre-se em cada detalhe de sua respiração, desde a temperatura até os aromas que estão presentes em cada movimento de inspiração e expiração. 6. Busque desligar de tudo ao seu redor, prestando atenção apenas em sua respiração e em nada mais (nenhum pensamento importante, nenhum compromisso imediato, nenhuma preocupação real). 7. Procure fluir neste movimento respiratório como se não houvesse limites entre você e sua respiração, como se o tempo estivesse sendo conduzido pela sua respiração. 8. Sinta toda sua intensidade presente neste momento de concentração respiratória. 9. Não queira estar em outro lugar ou em outra situação que sua mente resolver propor – esteja presente na respiração. 10. Respire com profundidade, levando o oxigênio para o seu abdômen. Inspire pelo nariz e expire pela boca. 11. Quando se sentir completamente concentrado e presente no ato da respiração, sem qualquer interferência externa ou mental, mergulhe na experiência de simplesmente estar no aqui e no agora – sem julgamentos, comparações ou conceitos. 12. Quando sentir uma inabalável paz interior, terá alcançado a consciência meditativa.
Dica: • Utilize, pelo menos, cinco minutos para este passo. • Se surgirem pensamentos, está tudo bem! Calmamente, volte para sua respiração.
Passo 2: Maranatha “Maranatha — Vem, Senhor Jesus!” (Ap 22,17-20; 1 Cor 16, 22).
1. Neste passo, damos continuidade à nossa prática. 2. Com calma, reze a oração de Dom John Main para iniciar o período da Meditação:
Pai Celeste, abri nossos corações para a silenciosa presença do espírito de Vosso Filho. Conduzi-nos àquele misterioso silêncio, onde Vosso amor é revelado a todos os que chamam. Maranatha. Vinde, Senhor Jesus.
3. Após a oração, mentalmente e de forma silenciosa, comece a repetir a palavra “Maranatha”. 4. Recite-a em quatro sílabas de igual duração. 5. Ouça a palavra enquanto vai repetindo com suavidade, mas continuamente. 6. Busque não pensar e nem imaginar nada, mesmo que seja de ordem espiritual. Se isso acontecer (e vai acontecer) volte para a entoação do mantra.
Dica: • Utilize, pelo menos, sete minutos para este passo. • Busque meditar com regularidade. Lembre-se da máxima: pouco, sempre e bem!
Passo 3: Shekinah “O seu corpo é templo do Espírito Santo.” (1Cor 3, 19).
1. O que minha meditação me faz responder ao Bom Deus? 2. Este passo é uma oração que nasce como fruto da meditação feita até agora. 3. Todo nosso silêncio nos conduz a dar uma resposta a Deus. Através do Espírito Santo, nos é suscitado o agradecer, o suplicar, o pedir perdão, o ofertar, o que surge em nosso coração.
Dica: • Este passo é tão íntimo quanto a oração. • Ele pode ser feito em voz alta ou em silêncio. Você pode ainda escrever, como que em um diário, aquilo que surgir ao final de cada meditação.
Devemos lembrar que esta é apenas uma metodologia, que busca nos conduzir para uma experiência de cultivo de nossa interioridade. Ela não pode ter fim em si mesma, mas é um caminho motivador. O importante é que façamos um processo de escuta, estando atentos a nós mesmos. Desejamos que a meditação nos leve para a vivência de nossa vocação de Batizados e que nos ajude a colocar em prática a missão de todo discípulo missionário: anunciar e viver a Boa Nova.
Você pode conferir uma sessão de meditação guiada do projeto #JuntosPodemos da PUCRS aqui.
Essas são dicas do Malone Rodrigues, líder da iniciativa de Meditação e Interioridade da Pastoral.
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