Meteoros, Bólidos e Bolas de Fogo

A queda de um super bólido, ocorrida nas primeiras horas de 1º de outubro de 2020, próximo aos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, provocou um brilho intenso que iluminou a noite por alguns segundos, deixando observadores assustados e se questionando sobre a origem do fenômeno. Episódios dessa natureza chamam atenção da população muitas vezes porque costumam ser erroneamente associados a OVNIs (Objetos Voadores Não Identificados). Mas o que são, afinal, bólidos? E qual sua relação com meteoros e bolas de fogo?

Registro da queda do bólido 01/10/20. Fonte: Bramon (Brazilian Meteor Observation Network)

Pra melhor entender a relação entre esses fenômenos, é importante entendermos as particularidades de cada um deles:

Cometa
Corpo sólido feito de gelo, rocha, poeira e gases congelados. À medida que se fraturam e se desintegram, alguns cometas deixam um rastro de detritos sólidos. Dimensões: o núcleo (parte sólida) pode possuir dezenas de quilômetros E a cauda, milhares de quilômetros.

Asteroide
Pequenos destroços rochosos, compostos por ferro ou gelo, que voam no espaço. Dimensões: de 1 metro até centenas de quilômetros.

Meteoroide
Um asteroide pequeno. Dimensões: de micrometros até 1 metro.

Meteoro
Luz emitida por um meteoroide ou asteroide ao entrar na atmosfera.

Bola de fogo
Um meteoro com intensidade de brilho maior que o planeta Vênus.

Bólido
Luz emitida por um grande meteoroide ou asteroide ao explodir na atmosfera.

Super Bólido
É um bólido que atinge a magnitude aparente de -17 ou superior, o que corresponde a 100 vezes o brilho de uma lua cheia, aproximadamente.

Meteorito
Fragmento de um meteoroide ou asteroide que sobrevive a passagem pela atmosfera e atinge o solo com massa variando de algumas gramas até toneladas.

A IAU (União Astronômica Internacional) utiliza os valores de “magnitude aparente” para diferenciar bolas de fogo, bólidos e super bólidos. A magnitude aparente de um corpo celeste é um número que mede o seu brilho a partir de um observador na terra. Quanto mais brilhante um objeto parece, menor é o valor de sua magnitude. Os valores de magnitude aparente dos objetos podem variar entre -27 até +30.  O Sol, por exemplo, com magnitude aparente de -27, é o objeto mais brilhante em nosso céu. Uma bola de fogo é caracterizada por um meteoro de magnitude aparente maior que -4. Já um bólido é caracterizado como um meteoro de magnitude aparente igual a -14 ou maior. E um super bólido atinge uma magnitude aparente de -17 ou ainda mais brilhante. A trajetória do super bólido registrado no Rio Grande do Sul  em 1ºde outubro de 2020 começou a brilhar a cerca de 89,5 km sobre a área rural a leste de Caxias do Sul e seguiu para o norte, a 16,9 km/s (60.900 km/h), com um ângulo de entrada de 44 graus em relação ao solo. Durante seis segundos, o meteoro brilhou forte, superando facilmente o brilho da lua cheia até sua explosão final e extinção, aos 22 km de altitude, sobre a cidade de Vacaria, também no Rio Grande do Sul.

Bólido comum. Fonte: wikipedia

 

Ocorrência

Vários milhares de meteoros de magnitude bola de fogo ocorrem na atmosfera da Terra a cada dia. A grande maioria deles, no entanto, ocorre sobre os oceanos e regiões desabitadas e muitos são mascarados pela luz do dia. Aqueles que ocorrem à noite também têm poucas chances de serem detectados, devido ao número relativamente baixo de pessoas para notá-los. Além disso, quanto mais brilhante a bola de fogo, mais raro é o evento. Observadores de meteoros experientes costumam observar, em média, uma bola de fogo de magnitude -6 ou maior para cada 200 horas de observação, enquanto uma bola de fogo de magnitude -4 pode ser esperada com a frequência de uma vez a cada 20 horas, aproximadamente.

Bolas de fogo detectadas entre1988 e 2020. Fonte: Alan B. Chamberlin (JPL/Caltech)

Cores vivas são relatadas com frequência por observadores de bolas de fogo, porque seu brilho é grande o suficiente para provocar a percepção das cores pela visão humana. As cores relatadas variam em todo o espectro, do vermelho ao azul brilhante e (raramente) violeta. A composição dominante de um meteoroide pode desempenhar um papel importante nas cores observadas de uma bola de fogo, com certos elementos exibindo cores características quando vaporizados. Por exemplo, o sódio produz uma cor amarela brilhante, o níquel é mostrado como verde e o magnésio como branco-azulado. A velocidade do meteoro também desempenha um papel importante, pois um nível mais alto de energia cinética intensifica certas cores em comparação com outras. Se uma bola de fogo muito brilhante, geralmente maior que magnitude -8, penetra na estratosfera, abaixo de uma altitude de cerca de 50 km, e explode como um bólido, há uma chance de que estrondos sônicos possam ser ouvidos no solo abaixo. Isso é mais provável se o bólido ocorrer em um ângulo de altitude de cerca de 45 graus ou mais para o observador, e é menos provável se o bólido ocorrer perto do horizonte. Como o som viaja a cerca de 20 km por minuto, geralmente demorará até quatro minutos, após a explosão visual, para que qualquer explosão sônica possa ser ouvida.

 

Riscos

Embora eventos como esses aconteçam regularmente, são poucos os que realmente podem apresentar um risco efetivo para os seres humanos. Estima-se que milhões de meteoros entram na atmosfera da Terra todos os dias. A grande maioria é minúscula e queima na entrada atmosférica, mas alguns são grandes o suficiente para explodir – quanto maior o meteoro, maior a explosão. A NASA registrou aproximadamente 800 bolas de fogo atmosféricas desde 1988 até os dias atuais, a maioria das quais ocorreram sobre o oceano. A quantidade de energia liberada na explosão do bólido é o grande problema: conforme a intensidade da explosão, a onda de choque que a acompanha pode danificar quaisquer objetos que se encontrarem nas proximidades.

Bólido de 20 metros de largura explodiu sem aviso sobre a cidade russa de Chelyabinsk, em fevereiro de 2013. (Fonte: Neuromainker via YouTube)

Portanto, embora esses eventos mais intensos ocorram poucas vezes por século (e devido a uma questão de coincidência e extensão territorial, grande parte deles ocorram na Rússia), eles podem ser incrivelmente destrutivos quando ocorrem sobre os continentes.

 

Meteoro de Chelyabinsk e Impacto de Tunguska

O meteoro Chelyabinsk foi um super bólido que entrou na atmosfera da Terra sobre a Rússia, em 15 de fevereiro de 2013. Foi causado por um meteoroide de aproximadamente 20 metros, que se movimentava a uma velocidade de 19 quilômetros por segundo e rapidamente se tornou um meteoro super bólido brilhante. A luz emitida pelo meteoro chegou a superar o brilho do Sol, sendo visível em um raio de até 100 km de distância. Algumas testemunhas oculares do evento relataram terem sentido, inclusive, o calor intenso da bola de fogo. O clarão brilhante produziu uma nuvem quente de poeira e gás, que atingiu 26 km de extensão. Pequenos meteoritos fragmentários foram identificados, além de uma grande onda de choque. A energia do objeto, cuja maior parte foi absorvida pela atmosfera, alcançou, antes do impacto atmosférico, o equivalente a 30 bombas atômicas como a detonada em Hiroshima, na Segunda Guerra Mundial. A explosão gerou pânico entre os residentes locais e cerca de 1.500 pessoas ficaram gravemente feridas. Todos os ferimentos foram causados ​​por efeitos indiretos e não pelo próprio meteoro, principalmente por vidros quebrados de janelas que explodiram com a passagem da onda de choque, minutos após o clarão do super bólido. Cerca de 7.200 prédios em seis cidades da região foram danificados pela onda de choque da explosão.

Comparação dos tamanhos possíveis dos asteroides Chelyabinsk (CM) e Tunguska (TM) com a Torre Eiffel e o Empire State Building. Fonte: wikipedia

O evento de Tunguska foi uma grande explosão que ocorreu perto do rio Podkamennaya Tunguska, na Rússia, em 30 de junho de 1908. A explosão sobre a taiga siberiana oriental arrasou cerca de 80 milhões de árvores em uma área florestal de 2.150 km2. Devido ao local remoto e à instrumentação limitada disponível na época do evento, as interpretações científicas modernas de sua causa e magnitude se basearam principalmente em avaliações de danos e estudos geológicos conduzidos muitos anos depois. Esses estudos produziram diferentes estimativas do tamanho do meteoroide (super bólido em sua explosão), variando de 50 a 190 metros. Estima-se que a onda de choque da explosão de ar teria chegado a 5,0 na escala de magnitude Richter e que sua energia teria atingido até 30 megatons de TNT. Em comparação, uma explosão dessa magnitude seria capaz de destruir uma grande área metropolitana.

Impacto de Tunguska em 1908. Fonte: Leonid Kulik Expedition

Desde o evento de 1908, houve cerca de 1.000 artigos acadêmicos (a maioria em russo) publicados sobre a explosão de Tunguska. Em 2013, uma equipe de pesquisadores publicou os resultados de uma análise de microamostras de um pântano perto do centro da área afetada, os quais mostram fragmentos de rocha que podem ser desse meteoroide. Tunguska é o maior evento de impacto na Terra registrado na história, embora impactos muito maiores tenham ocorrido em tempos pré-históricos.

 

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Referências:
https://www.amsmeteors.org/
https://www.iau.org/
http://www.bramonmeteor.org/
https://science.nasa.gov/science-news/science-at-nasa/2008/30jun_tunguska/
https://cneos.jpl.nasa.gov/fireballs/

S.N. Zamozdra, Characteristics of Chelyabinsk superbolide, Bulletin of Chelyabinsk state university. 19 (2014) 6-15.