Professor da Escola de Humanidades da PUCRS explica a logoterapia e como ela pode ser aplicada durante a quarentena
Lembranças e vontades. Simples atos, como abraçar, ter contato familiar, praticar um esporte coletivo, confraternizar com amigos, viajar a destinos desconhecidos. Muitos são os desejos compartilhados pelas pessoas, principalmente nas redes sociais, diante da quarentena provocada pela Covid-19. Essa falta de liberdade, em razão do isolamento social, tem afetado a saúde mental da população, gerando ansiedade e depressão. Muitas reflexões têm sido realizadas neste período crítico, e uma abordagem psicoterapêutica se propõe a analisar o sentido da vida: a logoterapia.
Leia também: PsiCOVIDa: conhecimento científico a favor do bem-estar
Segundo o professor da Escola de Humanidades da PUCRS, Luciano Marques de Jesus, a logoterapia, fundada pelo neuropsiquiatra austríaco Viktor Frankl, é também conhecida como a Terceira Escola Vienense de Psicoterapia. O médico ficou mundialmente conhecido depois de descrever a sua experiência dramática em quatro campos de concentração nazistas durante a Segunda Guerra Mundial, em seu best-seller internacional Em Busca de Sentido. “Frankl preconiza que a chave interpretativa do ser humano é a vontade de sentido, diferentemente da vontade de prazer de Sigmund Freud (Psicanálise) e da vontade de poder de Alfred Adler (Psicologia Individual)”, comenta o docente da PUCRS.
Autor do livro Qual é o sentido?: reflexões sobre o sentido da vida a partir de Viktor Frankl, da editora Edipucrs, o professor da Universidade aborda a pandemia e a logoterapia.
– Frankl sobreviveu a situações que beiraram a sua morte. Quais são lições que podem ser tiradas desse extremo para o que vivemos nos dias de hoje diante do isolamento social?
Viktor Frankl passou por vários campos de concentração, experimentando o que de pior a humanidade foi capaz de produzir. Nessa experiência, constatou que as perspectivas freudiana e adleriana se mostraram insuficientes. O que caracteriza o ser humano é a sua vontade de descobrir um sentido na vida. Encontramos sentido sempre pela realização de valores. Valores criadores ou criativos, por exemplo, o que fazemos pelo mundo, como o nosso trabalho ou uma ação de voluntariado. Valores vivenciais ou experienciais, aquilo que recebemos do mundo: a amizade, o amor, a arte ou a música. Também valores atitudinais, que é a nossa atitude diante do sofrimento inevitável; não podendo modificar a realidade que nos circunda, está nas nossas mãos mudar a nós mesmos.
– Nas redes sociais são expressadas diversas saudades. Como usar essas reflexões para valorizar o que se fez e o que se tem para o futuro?
Em logoterapia, temos a tríade: Liberdade da Vontade, Vontade de Sentido e Sentido da Vida. Para Frankl, o ser humano é incondicionalmente livre, é o ser que constrói a câmara de gás e também o que entra na câmara de gás, de cabeça erguida, com um Pai Nosso ou um Shemá Israel nos lábios.
– A logoterapia detecta o sentido específico e individual das pessoas. De que maneira pode ser feito isso?
A questão da busca e da descoberta do sentido da vida é uma tarefa personalíssima e indelegável, compete a cada ser humano e varia de pessoa para pessoa e em cada momento da vida.
– Saber lidar com adversidades extremas, como a pandemia, pode ser um dos propósitos do sentido da vida?
O momento no qual vivemos nos desafia, a cada dia, descobrir um novo sentido. Podemos ajudar o mundo e fazer nossa parte ficando em casa e, quando não conseguimos mudar a realidade externa, podemos mudar a nós mesmos.
Conforme dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), de 2019, o Brasil tem o maior número de pessoas ansiosas do mundo: 18,6 milhões de brasileiros (9,3% da população) convivem com o transtorno. Já em relação à depressão, são 5,8% da sociedade brasileira, taxa acima da média global, que é de 4,4%. Essa porcentagem significa que quase 12 milhões de brasileiros sofrem com a doença.
Um dos maiores especialistas do Brasil em Viktor Frankl e logoterapia. Filósofo, professor e palestrante, Luciano Marques de Jesus atua principalmente nos seguintes temas: Introdução à Filosofia, Ética e Cidadania, Antropologia Filosófica, Descartes e Filosofia Moderna, Viktor Frankl, Logoterapia e Sentido da Vida. É autor do livro A questão de Deus na Filosofia de Descartes.
O professor também faz parte do quadro docente de seis pós-graduações do PUCRS Online:
Leia também: Hábitos podem ajudar na saúde mental em tempos de crise